Integrantes do movimento participaram de audiência pública na Faculdade de Direito da USP, no Largo do São Francisco, Centro de SP.
O Movimento Independente Mães de Maio, formado por mães e parentes de vítimas da violência do Estado, realizou audiência pública nesta quinta-feira (18), em São Paulo, para relembrar os 17 anos dos Crimes de Maio.
No mês de maio de 2006, ataques da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital) terminou com a morte de mais de 50 agentes de segurança pública, e provocaram medo e sensação de insegurança na população paulista, que ficou dias trancada em casa.
Durante a sessão, a fundadora do movimento, Debora Maria da Silva, cobrou a aprovação de um projeto de lei para prestar apoio psicológico a mães de pessoas mortas pelo Estado. Na sequência, relembrou os crimes.
“Nós não podemos aceitar 600 jovens assassinados em uma semana. Não estamos falando de uma chacina de três ou quatro, o Estado provocou o desaparecimento dessas pessoas”, disse, na abertura do evento.
Durante sua fala, Debora Maria se dirigiu à representante do Ministério da Igualdade Racial, comandado por Anielle Franco, e disse que “a dor da mãe de Marielle também é a dor das Mães de Maio”. Anielle é irmã de Marielle Franco, vereadora preta assassinada no Rio de Janeiro, em março de 2018.
Ana Paula de Oliveira, criadora do coletivo Mães de Manguinhos, disse que a união entre as mães as fortalece para que seus filhos não sejam esquecidos. Ela é mãe de Johnathan Oliveira Lima, assassinado em 2014 por um policial militar no Rio de Janeiro.
“A luta tem que ser de toda uma sociedade. Lutamos pelos nossos filhos que se foram, sim, e pelos filhos que estão por aí. Estamos falando de vidas negras, pobres e faveladas, que para uma boa parte da sociedade não vale nada”, disse.
Marivaldo Pereira, representante do Ministério da Justiça de Flávio Dino (PSB), citou projetos da pasta para prestar assistência às mães de vítimas do estado. Ele recitou Racionais MCs em sua fala.
“Uma das principais pautas da nossa secretaria tem sido as câmeras nos fardamento dos policiais, com caso de São Paulo, que caiu a morte de jovens. Estamos junto com as mães do Rio com a ADPF das favelas [Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 635]. E trabalhamos para implementar projeto de acolhimento e encaminhamento para as mães”, afirmou.
Nesta semana, o Fórum Brasileiro da Segurança Pública divulgou pesquisa que indica diminuição de 80% nas mortes de jovens provocadas pela PM em São Paulo desde a implementação das câmeras nos uniformes.
Marivaldo, junto do deputado estadual por SP Eduardo Suplicy (PT), eram os únicos homens na bancada formada na Faculdade de Direito.
Relembre os Crimes de Maio
Bases da polícia, bombeiros, agentes penitenciários e policiais de folga foram atacados em ações orquestradas pelo PCC, em maio de 2006. O dia 15, uma segunda-feira, marcou o ápice da onda de violência iniciada alguns dias antes. Naquela data, a cidade de São Paulo parou.
Nos dias seguintes, uma retaliação aos ataques contra a polícia resultou na morte de civis no estado, a maioria pessoas sem passagem pela polícia.
A retaliação do poder público, por meio de seu braço armado, resultou na morte de centenas de civis em todo o estado de São Paulo. Após a série de revides, a Ouvidoria das Polícias diz que 493 pessoas morreram na onda de ataques, mas até hoje não há um número oficial de vítimas, que pode variar de 264 a 600.
Mães de vítimas de ataques em Santos entraram com pedido na Procuradoria Geral da República (PGR) da pela morte de 9 jovens por supostos grupos de extermínio. Diante da demora no pedido de federalização, a Defensoria Pública encaminhou a denúncia à Organização dos Estados Americanos (OEA) em 2015.
A Secretaria de Segurança Pública de São Paulo sempre afirmou que as mortes foram investigadas corretamente e que “não há como reabrir o caso sem novas provas”.
Investigações dos Crimes de Maio
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, em agosto de 2022, federalizar as investigações dos Crimes de Maio ocorridos no Parque Bristol, Zona Sul da capital. Cinco jovens foram atacados por um grupo de homens encapuzados.
Três deles morreram na hora e um sobrevivente foi morto seis meses depois. O caso foi arquivado pelo Ministério Público de São Paulo pela ausência de provas.
Como o g1 revelou, a solicitação de federalização foi feita em 2016 pelo então procurador-geral da república Rodrigo Janot ao STJ, atendendo a pedido de 2009 da Conectas e familiares das cinco vítimas.
Na época, a PGR declarou que a apuração da Polícia Civil e do Ministério Público de São Paulo foi meramente “formal, protocolar, ignorando a busca da verdade e das conexões entre crimes quase simultâneos e extremamente similares”.
Em seu despacho, Janot diz que “mostra-se evidente que o arquivamento em si da investigação configura violação do dever estatal de adequada e eficiente investigação, visto que a apuração pode ser acoimada [acusada] de insuficiente, por sua fragilidade, por não ter considerado o contexto em que produzidos os fatos, por não ter ouvido os policiais militares em atuação na região, por não ter se preocupado com a oitiva de testemunhas em linha de investigação razoável”.