A viagem de lua de mel com a Hurb, antiga Hotel Urbano, acabou. A empresa que ofereceu pacotes promocionais a preço de bananas desde o início da pandemia está vivendo, provavelmente, seu pior momento na história com a renúncia de seu CEO, processos na Justiça e uma lista extensa de reclamações na internet, que agora inclui a acusação de esquema de pirâmide.

Na esteira de calotes em hotéis, disparada nas reclamações de clientes e até a abertura de um processo pela Secretaria Nacional do Consumidor (Senacom) do Ministério da Justiça e Segurança Pública, os internautas estão acusando a companhia de fazer pirâmide financeira e capital de giro com dinheiro dos clientes.

O jornalista Ricardo Freire, que escrevia semanalmente a coluna “Turista Profissional”, no caderno Viagem & Aventura no Estadão, acusou a Hurb de realizar um esquema de pirâmide com os pacotes de viagens baratos pagos com adiantamento.

“Nesse esquema, o cliente adianta o dinheiro para a empresa fazer caixa e depois tentar, na época da viagem, viabilizar o pacote que não existia no momento da compra. Se não conseguir, devolve o dinheiro sem juros – depois de alguma briga”, disse o jornalista em sua conta no Twitter.

 

Freire, no entanto, não é o único a constatar a suspeita de um esquema de pirâmide na Hurb. Somente no Facebook já são mais de 20 mil membros relatando suas experiências em busca de ajuda e alternativas, enquanto no site Reclame Aqui as acusações se intensificam cada vez mais.

A questão é que, com a retomada das atividades e a disparada dos preços de hotéis e passagens de avião, a empresa não está conseguindo encontrar tarifas promocionais para honrar as obrigações com os clientes. Com isso, viagens estão sendo seguidamente adiadas.

Foi isso o que aconteceu com um usuário do Rio de Janeiro, que teve sua viagem para Foz do Iguaçu cancelada por tempo indeterminado. “Após realizar o agendamento conforme a regra de reserva do Hotel Urbano, não tive a reserva feita do pacote que seria até 45 dias antes da primeira data”, disse o usuário.

“Estou constatando que a empresa está colocando dinheiro de outros pacotes futuros para honrar os pacotes atuais. E que deste modo num futuro muito próximo não estará honrando seus serviços ofertados para frente”, completou.

As acusações não se restringem somente ao site Reclame Aqui. No Twitter, a usuária Gabby Paiva também acusou a Hurb de realizar um esquema de pirâmide, e a companhia respondeu:

No TikTok, o perfil mocaviacao também expôs a queda nas avaliações da Hurb, com uma série de comentários de usuários perguntando onde estão seus voos, o que aconteceu com suas viagens e pedindo o envio de datas.

Os usuários não foram os únicos afetados. Hotéis como o Novo Hotel Recife estão utilizando as redes sociais para denunciar a falta de pagamentos da Hurb.

“Mediante o caso de inadimplência da Operadora Hotel Urbano, o Novo Hotell Recife também foi afetado, deixando de receber os pagamentos das estadias realizadas através do Hurb @hurb. A empresa envolvida não retorna os contatos, ignora todos os e-mails e ligações que realizamos. Com pesar informamos que, a contar desta data (06/04/2023), os check-ins dos clientes via Operadora Hotel Urbano estão suspensos”, disseram em seu Instagram.

No site Meu Milhão de Milhas, os usuários constatam uma nova onda de promoções, que parecem ser feitas para conseguir pagar as dívidas pendentes deste ano.

“Tá me parecendo que agora além de pagar as próprias contas eles têm que reembolsar pacotes vendidos (e não usufruídos) no ano passado. Essas novas “promoções” são para se voar em 2023/2024. Me pergunto mais quanto tempo vai durar essa pirâmide”, disse um usuário.

O que é uma pirâmide financeira

Um esquema de pirâmide financeira tem uma premissa simples e tentadora: investir um valor inicial básico com o objetivo de fazer com que esse valor dobre, triplique, quadruplique, e assim por diante.

“A pirâmide financeira se constitui em uma ação ilícita por meio a qual golpistas obtém ganhos imoderados em detrimento de um número indeterminado de pessoas, com a promessa de ganhos ou lucros exorbitantes, cujo êxito, em favor dos fraudadores, depende essencialmente da entrada constante de novos valores”, explica o advogado criminalista Adib Abdouni.

De acordo com Abdouni, o esquema é sustentado mediante intenso marketing para impulsionar a vítima a captar recursos junto a parentes e amigos, que se dispõem a ingressar na base do negócio, sob a promessa de receber vantagens exponenciais pela captação desses novos integrantes.

A pirâmide financeira é considerada crime e é enquadrada na Lei 1.521/51 com pena prevista de seis meses a dois anos de detenção e multa. “Apenas os idealizadores e um grupo seleto de envolvidos no negócio ilícito enriquecem por meio da fraude”, destaca o criminalista.

No caso da Hurb, o advogado observa que os episódios de cancelamento ou adiamento sucessivo de pacotes de viagens com datas flexíveis não caracterizam a prática de pirâmide financeira, mas sim, prática abusiva, que pode ser classificada como crime contra a relação de consumo (prevista no artigo 66 do Código de Defesa do Consumidor).

“Fazer afirmação falsa ou enganosa sobre o serviço prestado, com pena de detenção de três meses a um ano e multa, mas sem prejuízo da apuração dos crimes de estelionato e organização criminosa”, afirma.

Posicionamento da Hurb

Em nota enviada ao E-Investidor, a empresa afirmou que “sempre prezou pela transparência com os seus viajantes e parceiros e, guiada pelo valor primordial de ser uma companhia feita de pessoas para pessoas, coloca o seu cliente e stakeholders em primeiro lugar”.

Além disso, a empresa destacou que os voos e o hotel da viagem são definidos de acordo com a disponibilidade do tarifário promocional, e que os pacotes de data flexível são aqueles promocionais, em que não é possível garantir uma data específica para a viagem no momento da compra.

No que diz respeito à relação com os hotéis, a Hurb declarou que: “Com relação à questão dos hotéis, o Hurb informa que está conduzindo, de forma individualizada, um diálogo com cada parceiro de rede hoteleira que fez algum tipo de reclamação, independente da sua natureza. Por questões legais, detalhes específicos não podem ser abertos.”